A recuperação financeira da capital alemã nos últimos anos é quase inacreditável. Turismo, jovens empresários e empresas de internet são alguns dos fatores. Mas a nova prosperidade também traz seu lado negativo.
Exatamente dez anos atrás, o prefeito de Berlim, Klaus Wowereit, lançou uma máxima para definir sua cidade: “Pobre, porém sexy”. Por mais espirituoso que seja, pelo menos no que concerne à pobreza o dito do político social-democrata aparentemente não procede mais.
Em meados de novembro, a prefeitura apresentou seus auspiciosos números: o orçamento da capital alemã para os próximos anos está equilibrado, dívidas são coisa do passado. “Berlim fez seus deveres de casa”, enfatizou Richard Meng, porta-voz do Senado berlinense, o equivalente à câmara municipal. A coalizão do governo da cidade-estado, composta por social-democratas e democrata-cristãos, administrou bem, focando os pontos certos.
Não faltou quem esfregasse os olhos, surpreso: há tempos Berlim é considerada cool e dinâmica, mas nunca teve finanças sólidas. E muito menos desde o fiasco da construção do novo aeroporto internacional, que se prolonga indefinidamente, tornando-se cada vez mais dispendioso.
Há muitos anos a capital alemã depende financeiramente dos estados mais ricos da federação. Ainda no primeiro semestre deste ano, Baviera, Hessen e Baden-Württemberg tiveram que transferir quase 2 bilhões de euros à capital, no contexto do programa de equiparação financeira estadual, encarregado de evitar que os estados federados se desenvolvam em direções opostas demais.
Catedral da terceira principal metrópole turística da Europa
Ímã para pioneiros e criativos
No entanto, há algum tempo a arrecadação de impostos da capital é generosa. Se as estimativas estiverem corretas, no próximo ano ela poderá até recolher 400 milhões de euros a mais do que gastará.
Um dos motivos para tal sucesso é a enorme expansão do turismo, que, no momento, é o segundo mais importante ramo de negócios da cidade. São 25 milhões de pernoites por ano. “Estamos em terceiro lugar na Europa, depois de Paris e Londres. E isso, naturalmente, traz empregos e verbas”, aponta Meng.
E há aqueles que não vêm apenas de visita, mas optam por se estabelecer em Berlim. A cada ano, a capital ganha quase 30 mil habitantes – embora a população da Alemanha, em geral, não esteja crescendo. Mesmo admitindo que outras metrópoles alemãs acusam essa mesma tendência, Meng está convencido que Berlim tem um poder de atração especial.
“A curiosidade em torno de Berlim é incrivelmente grande, sobretudo entre os jovens”, comenta. “A cidade tem um grande magnetismo para gente que deseja ter experiências fora do comum, ser criativa, desenvolver algo.”
Isso não se aplica apenas a aventureiros temerários. Nos últimos anos, cada vez mais grandes empresas e organizações transferiram suas sedes para Berlim. Entre muitos outros, agora a multinacional de informática Microsoft está estabelecida no centro da capital, em cerca de 3 mil metros quadrados, distribuídos por quatro andares, no nobre endereço Unter den Linden, 17.
Explorando um potencial negligenciado
Uma outra fonte da súbita bênção financeira para a capital são as inúmeras pequenas firmas de internet e mídia, que vêm pipocando nos últimos anos. “Berlim tem um papel importante, também internacionalmente, justamente no que concerne o meio internáutico”, confirma Michael Bahrke, do instituto econômico IW. “Nesse setor, a cidade dispõe agora de uma infraestrutura sem igual, tanto na Alemanha quanto em nível mundial.”
Atualmente, quase 4% da criação de riqueza da metrópole provém da área de TI-internet, um dos setores de mais futuro. Além disso, há os inúmeros clubes, bares e pequenas lojas de design, inaugurados quase diariamente em bairros da moda como Friedrichshain ou Neukölln.
Esse verdadeiro boom de criação de firmas se reflete também em números: desde 2005, o desempenho econômico berlinense cresceu 17% – mais até do que o de estados tradicionalmente fortes, como a Baviera. Isso gera postos de trabalho: no mesmo período de oito anos, o número de empregos sujeitos a contribuição para a previdência social aumentou 17%, mais do que em qualquer um dos demais estados federados.
Também os salários crescem. Segundo Bahrke, isso não é de se espantar: a cidade está explorando agora um potencial já existente há anos. “Do ponto de vista econômico, Berlim alcança assim um status que já lhe cabia há muito tempo”, comenta o economista.
Antigos moradores ameaçados de serem os perdedores do êxito econômico da metrópole
O reverso da medalha
Porém todos esses números encorajadores também trazem consequências negativas. Um deles é a escalada radical dos preços dos aluguéis. Os imóveis também encareceram vertiginosamente em anos recentes, e continuam atraindo cada vez mais especuladores.
O porta-voz do Senado diz recear que, quanto mais a cidade prospera, mais premente se torna a questão “Quem está vindo para cá?”. “Então vem gente endinheirada, e por vezes aqueles que já vivem há muito tempo aqui, e que não têm tanto dinheiro, se sentem ameaçados.”
Nos bairros da moda, já é um fato o desalojamento dos moradores tradicionais, tanto por “novos berlinenses” abastados como pelas residências de férias e hotéis que se alastram por toda parte.
Meng assegura que a administração da cidade-estado está consciente da necessidade de se dedicar a novas tarefas, como a construção de moradias, agora que dispõe de mais verbas. Além disso, uma população crescente traz problemas em diversas áreas – por exemplo, no tocante a jardins-de-infância e escolas.
Também Bahrke, do IW, adverte que o desenvolvimento positivo só beneficia uma parte da capital alemã. Há o perigo de um exacerbamento da divisão social, com um número crescente de ricos no centro e cada vez mais pequenos assalariados e desempregados nos bairros-problema da periferia, cujo desamparo é crescente. A política precisa cuidar para que todos os berlinenses se beneficiem do êxito de sua cidade, reivindica o economista.